terça-feira, 18 de agosto de 2015

     Vivemos numa sociedade onde a alegria é cada vez menos. Essa falta de alegria começa, à partida, em nós.  

    Decidimos então sair para beber um café e aliviar tensões tecidas pela rotina brutal da vida. Atravessamos jardins cheios de idosos, que, logo de manhã, saem das suas tocas. Alguns vêm sozinhos e juntam-se sistematicamente no mesmo banco, à sombra de grandes árvores. Outros vêm em bandos, numa saída programada pelos lares que os acolhem, adornados com as seus melhores roupagens, para camuflarem um pouco a sua infelicidade.

       No resto dos jardins, vemos outros grupos, não de idosos, mas de jovens com a desilusão traçada nos seus semblantes e a indolência visível nos seus gestos. Alguns são eternos desempregados, com demasiados ou poucos estudos, que tudo serve para impedir o acesso ao pouco trabalho mal pago que vai aparecendo. Outros fingem que trabalham ou que cumprem integralmente programas de reinserção a troco de um subsídio que vão gastando em tabaco e cervejas no café da esquina. Outros, ainda, arrastam atrás de si duas ou três crianças, possivelmente sem futuro, mas que, de momento, são a sua única fonte de rendimento. Há ainda os que se perdem em longas conversas de telemóvel, de saco vazio ao lado, enquanto esperam a hora a que as instituições de solidariedade lhes disponibilizam os almoços ou os jantares que umas vezes comem e outras talvez não.

        Não tão visíveis, mas frequentemente presentes, vagueiam por entre os canteiros de flores, junto aos bancos ocupados, mulheres de meia idade, em cima de umas más sandálias de salto alto e dentro de uma saia dois números abaixo dos seus. Com os seus gestos e sorrisos lânguidos e nojentos, tentam sacar aos velhos babosos algumas moedas que lhes possam alimentar os vícios ou a preguiça.

     Pelas ruas, cruzamo-nos com grupinhos não menos tristes, ou almas sós e silenciosas, talvez macerando as suas desilusões. Há outros que agitam os corpos e as bocas desdentadas em risos tão descontrolados quanto as suas próprias faculdades.

    Talvez nada disto seja real e a idade me tenha tornado numa mulher ainda mais amarga e intolerante e com visão deturpada das coisas. Gostava que assim fosse e que apenas eu visse assim a minha terra, o meu país, as minhas gentes. Gostava que apenas eu olhasse o futuro como algo muito nublado, onde mais vendavais e tormentas nos esperam. Oxalá assim fosse. Mas, ou muito me engano, ou será ainda pior daqui a dez /quinze anos, quando a sociedade que agora polvilha as nossas cidades tiver maduros os seus frutos que foram gerados nestas condições adversas e em resultado de atos impensados ou inconscientes.

1 comentário:

Reflexos e Sinais da Alma disse...

Irneh ,

Numa sociedade hipócrita e sem valores como esta , todos aqueles que falam claro e com sinceridade , são normalmente olhados de soslaio , geralmente por esses que se movimentam pela mediocridade e pelo mundo dos jogos de cintura e dos interesses encapotados , pela hipócrisia fundada no calculísmo para atingirem os seus próprios fins ... enfim , seriam uma eternidade de contextos e situações que poderia enunciar nesta realidade que a cada um nos cerca , e que assim obriga a quem não entra nesse jogo a uma distanciação correta para que não sejamos mais feridos nesta demanda que o nosso próprio Espírito nos impele a não pertencer !!

Excelente Post !

Um Beijinho
Luis Sousa